domingo, março 26, 2006

Força

Existe uma força que sopra cintilante, sem saber o que há em sua volta, uma força fininha e poderosa, que segura as amarras daquilo que somos ou julgamos ser, esse paradoxo sem nome que nos perturba as razões adquiridas ao longo dos tempos, a força.
Existe uma força que no seu esplendor julgamos ser inabalável, que julgamos detentora de todas as coisas boas, de todos os impulsos felizes que nos ocorrem, pode ser inspiração, mas pode ser muito mais, a inspiração só é aproveitada já no seu final, daí a criação ser sempre um milésimo daquilo que poderia ser uma apoteose de tudo. Imagino o que seria se essa força fosse canalizada logo no seu momento inicial, imagino o brilho incessante da força que cegava qualquer um no seu visionamento, um abrir de janela iluminada sem culpa depois da noite escura. A força não precisa de ser tudo, quando não se tem nada ela não existe...existe, ela nunca deixa de existir, mas não brilha é anónima na sua cor, no seu brilho, os olhos são cegos à luz, e como não a vislumbramos esquecemo-nos da sua existência, perdemos o caminho da sua luz e seguimos um caminho contrário, um caminho onde não há motivos nem razões, e onde não paramos de tactear o chão na busca do que não existe.
Existe uma força, e existem as explicações, exigimos sempre explicações, motivos, porquês, papeis, livros, frases, poesias, relatórios que não existem, o coração não tem arquivo destas coisas, não há lugar para isso nele, gostamos de tal maneira que os únicos arquivos são filmes e fotografias muitas vezes em silêncio, é tão pequeno que quase nem cabem as palavras. É tão limitado que só fica o importante, a semente da força cintilante, que arrasa mundos e castelos encantados, porque o único paradoxo do coração é o real e a imaginação, não há limites, distancias, definições, finais, nada, nada termina, nem nada acaba, o coração é o único que não perturba o seu ritmo na vida, só o coração é constante de amar as forças.
Existe uma força, que não damos valor, porque a adquirimos sem sabermos como o jornal que se folheia em desdém de manha porque nos impuseram que temos de saber tudo o que acontece, porque é bom nos distrairmos com os problemas dos outros quando deixamos de ver a força.

(não consegui acabar esta coisa sem jeito......ficou assim até à próxima onda boa de apanhar, ou até conseguir ver a força de novo)

sábado, fevereiro 18, 2006

O poder do agora....


O tempo passa numa monotonia extrema, tudo muda na inércia dos dias, a roupa que trazemos vestida, as folhas das arvores, os humores, os livros da escola, as peles que esticam e encolhem, as rugas que crescem, os ossos que incham com o ar, e sem darmos por nada parece que a nossa história dos minutos e segundos já enxia uma biblioteca.
Não me senti a crescer, e quando olho para trás mesmo por de trás das lentes grossas dos olhos já miupes como se fossem comidos pelo sol, vislumbro-nos em cima de cadeiras a trocar carinhos fazendo de conta que eramos já gente muito crescida. Sempre pensamos que éramos muito grandes, que os adultos eram parvos em não comprender que éramos nós, o romeu e a julieta que tinham vindo de novo adoçar o mundo com novas aventuras.


Hoje lemos as histórias, e as palavras que não foram ditas nos lábios e nos olhos um do outro, porque é ai onde o coração nos fala dos silencios que deviamos ter trocado enquanto o que saiam eram ruídos de quem não sabe o que diz, e tantas vezes não soubemos ler o que realmente queriamos dizer. Já o outro cantava, demasiado amor acaba por matar amor, por te matar a ti, porque vidas temos só uma, mas a alma podemos perder pedaços sem grandes alterações fisicas. Perdemos tantos pedaçinhos de alma ás custa um do outro, era sentimento a mais para quem não sabia nem fazer inequações de segundo e terceiro grau, e como tal acabamos por sofrer nas mãos um do outro por não sabermos o que fazer ao amor.
O sofrimente é algo que transcende o ser humano, achamos nós, que não aguentamos, que só nos acontece a nós, batalhas perdidas. Porque será que nunca consideramos esta batalha perdida? Maior parte das pessoas entregava-se ao sofrimento e não à racionalidade, mas nós não, nunca.O nosso erro nunca se encontrou na derrota, mas sim na busca eterna da vitória para nós, porque o que vivemos sempre consideramos ser o melhor da vida.
O agora que se vive tornasse dificil de aceitar tão crualmente, porque parece que todos os caminhos foram os errados, porque sempre escolhemos aquele que nos levava para longe do que cad aum considerava a meta.
No dia e hora em que se toma a consciência de que o único momento que existe é o Presente lembramo-nos que o passado não passa de um aglomerado de cartas de amor e fotografias tiradas em cenários romanticos e que no futuro sera dificil de imprimir essas mesmas expressões que outrora trouxemos no rosto.
O único momento que existe é o agora. O passado e o futuro são os apoios do ego. Por isso não se pode estar no presente, enquanto nos identificarmos com a mente.
(...)

segunda-feira, fevereiro 13, 2006

Não estás

Sábado à noite. Passaram apenas uns minutos desde que me deixaste aqui perdida em pensamentos encostada à janela onde o teu reflexo é ainda visível. Vi-te chegar lá em baixo, vi-te procurar a chave duas vezes nos bolsos, vi-te a sorrir-me, e vi-te ainda a entrar no carro e a partir. Apetecia-me correr atrás de ti, mesmo nestes trajes de trazer por casa e gritar com todas as minhas forças para não partires. O tempo saqueou me o coração e levou-me com ele a viajar por todos os minutos antes, quando entraste em minha casa, quando pousaste o casaco sobre o sofá, quando olhaste para o fogão e pensaste que estaria eu a fazer, quando me encontraste descansada de um dia no sofá. Pausa. Deixo-me ficar presa naquele instante preso na minha memória, vejo-te encostado a mim, beijaste-me, juro que conseguiria ficar presa naquele instante eternamente se não fosse esse inútil do tempo, que me apaga os momentos, que me faz ir até a solidão todas as noites só por capricho, quando eu queria era voltar atrás.
Deixo a memória rolar. Play. Sentaste-te a meu lado deixaste que me aninhasse nos teus baços e ficamos ali como se fossemos obrigados a sentir os nossos corpos colados, como se fosse um castigo sentir-me protegida, ter-te junto a mim, como se houvesse alguma coisa que nos unia, e nos fazia querer ficar, agora sempre, e para sempre. Pausa. Corro para o sofá, o teu cheiro está lá, tão presente, há restos de amor e de solidão, e tu tão distante, quem me dera ter-te de novo comigo, dormir no teu abraço, fazer parte de ti. As memórias daquela noite continuam a percorrer-me os sentidos, o corpo não resiste, aninhada na solidão e no silêncio, deixo-me levar pelo sono.
O amor é a poesia da sabedoria, quando acaba todas frases fazem sentido, todos os gestos tem finalmente uma resposta, e tudo porque acaba a aula e podes colocar em prática o que viveste. O amor só faz sentido quando termina. Só ai consegues tirar a venda dos olhos e ver realmente o que tocaste, por onde passaste, e até onde te perdeste tantas vezes, sem quereres saber quem era, o que fazias, quem eras tu ali.
Aproveito-me desta cegueira temporária para poder errar na razão, para justificar os meus actos meio tresloucados, para poder ser eu, mas contigo.
Um sonho desperta-me de novo, chamo por ti. Não estás.

Vazio

Vazio porque não sobrou mais nada….Sinto-me como se um vestido de festa, que é tratado com cuidado, que faz sucesso, que brilha e ilumina um corpo, feito de materiais caros que simulam ilusões naqueles que o invejam, são os brilhos, as pedras, e toda a fantasia, que naquela noite vai dormir no chão para depois ser arrumado a um canto, porque já passou o seu momento de glória.
Fui usada, fui humilhada, tratada que nem um objecto….Odeio tudo e todos, pelos sentimentos que me obrigam a nutrir, fizeram me sentir especial tiraram proveito e agora que a festa acabou, ficaram as marcas de baton, os discos partidos, e os brilhos no chão.
Ninguém tem o direito de possuir uma alma, sem saber o que se passa no coração, não vale a pena procurarem o botão agora, ele não existe não da para desligar, toda gente sabe que não….isto é uma doença, sinto nojo de um corpo que até me pertence, um corpo que atrai e que repele aqueles que passam por perto, onde a beleza se esconde por timidez num sorriso sem brilho. Não passo de um corpo que exalta movimentos nobres que chamam a atenção de alguns, só represento isto para vocês, como se fosse uma almofada onde encostam a cabeça e desabafam, e onde descarregam a raiva quando o mundo inteiro vos virou as costas por não valerem nada ou por não saberem dar valor.
Não sou mulher objecto, não sou boneca de trapos que se pega e larga por não dar jeito agora, não sou efemeridade de espécie alguma, sou eu corrente permanente, um padrão estável e único de características e comportamentos próprios de um indivíduo.
Estou cheia de me sentir vazia, no fundo do poço, cheia de estar no meio de tanta gente e mesmo assim continuar sozinha.
Que morra junto com o ódio que sinto, a vossa vontade de estar comigo, só porque até sabe bem, ou porque não há mais ninguém a quem a recorrer, porque eu continuo aqui sempre disposta a cair no mesmo erro….


As almas são incomunicáveis.Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.Porque os corpos se entendem, mas as almas não...
(Manuel Bandeira)

Denuncia

Não compreendo porque as palavras em nós se amarram num silêncio perturbador, tento faze-las sair mas não consigo.
O que sinto intimida-me por não ser correcto, por ter criado uma ideia dentro de mim que estou errada, que não podemos ser.
Vivemos lado a lado com um muro transparente entre nós, fazemos tudo o que os sentimentos mandam, só não nos ouvimos nas palavras mágicas, só não nos inebriamos no aroma do toque.
Não conheço a natureza desta barreira, porque apareceu aqui, porque nos escolheu, ou porque decorou ela os nossos nomes, e nos encheu a cabeça de medos, e fantasmas de futuros que nunca chegarão.
Medo que me faz pensar que te gosto no mesmo instante em que não passas de um qualquer, de um outro mais, um nome perdido no meio de livros e cadernos que teimo em encher.
Vivemos num constante campeonato, tentando provar um ao outro que conseguimos mais, que vivemos muito mais um sem o outro. Passamos o pano frio pelos olhos, é tão bom poder ver só aquilo que queremos, e é assim que nos vamos habituando à ausência de nós mesmos.
Fazemo-nos sentir em confusão permanente, ondas do mar que vão e vem, e trazem sempre a mesma maré, as mesmas águas, os mesmos gostos, o mesmo gostar.
Nunca nos perderemos nos sentidos, não sei se por respeito, se por timidez de não sermos os ideais imaginados um do outro. Andaremos uma vida em buscas de aventuras e desafios, de ideias, de metades, de espelhos, e dos complementos, mas saberemos sempre, que existe o outro lado do muro, onde os sentimentos não falam e não se tocam corpos, onde somos desconhecidos, por nos conhecermos tão bem.

Um dia hei-de ser anjo- alma do avesso


Quando me vi no espelho pela manha, observei-lhe as costuras certinhas, todas alinhadas num nylon branco, foi bordada à mão, cada ponto foi dado com dor para eu na vida transformar em amor. Tinha vestido a alma do avesso hoje, com as asas presas do lado de dentro mas que importa hoje nem parece ser dia de voar nas minhas fantasias.
Sai pelas ruas, olhos nos olhos com as pedras da calçada, uma e outra, ali estão elas nos mesmos lugares de sempre, é preciso vestir a alma ao contrário para reparar nas insignificâncias que nos caem de cima sem percebermos e mancham os casacos quando andamos na rua, coisas que nos cobrem os dias. As pedras de sempre por mim pisadas uns dias umas, quase todas calcadas mas só hoje vistas pela ligeira inclinação da minha cabeça provocada por ideias que não dormem há muito na minha que não aguentam o corpo sobre as pernas, que são pesos mortos.
Não vi as pessoas que se cruzavam comigo nesta jornada de correrias, de coisas por fazer, de coisas para ver, de coisas para comprar, de coisas por dizer, de coisas para pensar, mas sempre a andar, os rostos, os sorrisos, as preocupações, essas coisas que vem impressas que nem jornais da manha, não as vi, queria só respirar o ar que tinha pela frente e que me empurrava os cabelos contra o destino.
Hoje não está tempo para voar, parei, a delicadeza da alma sobre a pele e as penas das asas amachucadas pelas fibras daquela vestimenta tão nobre afligem-me à medida que tento avançar, sentimentos descontínuos, luzes que acendem e apagam nas janelas desta cidade, luz e escuridão, no terceiro andar, no sétimo andar, um pisca-pisca que me arde nos olhos cá dentro como se fosse perseguida pela luz e pela escuridão enquanto as pedras lá em baixo me seguram os pés para não fugir para longe, para se sentirem protegidas, para não serem pisadas por almas sujas como a minha.
Vou voltar para trás, tenho as asas sujas da vida a picarem-me a pele ferida pela vida, tanta fuligem que vejo caída pelo corpo que me sinto tentada a pensar que não se aproveita nada de puro e verdadeiro em mim.
Janelas que se acendem e apagam, brilham nos meus olhos só hoje as vêem porque vesti a alma ao contrário ninguém reparou no meu corpo tombado, que o vento abraça com a poeira.
Vou voltar a adormecer. Amanha coloco alma no lugar, foi um sonho porque as asas estão sempre dispostas a voar.

medo de?

Oiço um eco na minha cabeça, qualquer coisa que grita cá dentro até lhe saltar o espírito.
Em que caminho ando eu a pisar os dias, será tudo isto realidade ou serei eu que me tento refugiar em fantasias, daquelas que se vestem em Fevereiro para sermos quem não somos, para sermos mais, menos, ou mais ou menos aquilo que queremos ser.
Tentei esconder todos estes receios numa caixa mas eles eram tantos que muitos ficaram entalados nos rebordos onde a tampa e a caixa de beijam, sinto-os a gemer de dor por não fazerem parte nem de dentro nem de fora, estão perdidos na sua realidade.
Agora não posso fazer nada. Não sei se alguém os ouve ao longe, não sei se alguém percebeu o que me aflige a alma, que me deixa arrepiada e cheia de traças na barriga e me faz cair crua no abismo que é a minha vida.
Tenho um labirinto na direcção do olhar, não sei explicar a ninguém como sair de lá, nem sei como cheguei aqui, quanto mais como se cruzam os pés dentro de paredes sem tecto.
Acho que preciso de algo que me faz fugir durante o seu encontro, não devia ser assim, mas as forças estão descontroladas, já não sei qual é o norte, acho até que encontrei o sul perdido.
Tenho o espírito doente com tanta confusão, só espreitei um pouco para ver os seus contornos e só vi linhas em nós, laços apertados, fibras gastas e comidas pelo sol. Fechei os olhos. O medo invade-me a cada passo que dou, à medida que troco o meu peso de pé para pé, de sapato em sapato se os tivesse calçados. Não quero andar. Tenho medo de não ter força para abrir os olhos antes da chegada do abismo. Mas qual abismo? Vejo-me lá no fundo mesmo sem abrir os olhos, vejo um corpo estendido lá em baixo, não é o meu, um corpo mais forte, terá caído antes de mim? Será que caí?
Oiço um eco na minha cabeça, qualquer coisa que grita cá dentro até lhe saltar o espírito. Medo de não ser, medo de não conhecer, medo de não conseguir entrar-te na vida, medo de tudo. Mas porquê medo?
Sinto-me um ponto final. Igual ao último que se leu, ao último que não viste porque não ligas a pontuação, pergunto se alguém se apercebeu conscientemente do valor deste sinal detector de atenções? Será que todas histórias acabam num ponto final? Qual é a história que vais escrever depois de mim?

Jantar a dois

As horas percorrem círculos em volta daquele jantar como se fossem cavalos de corrida silenciosos. O barulho dos talheres no toque com o prato, orquestra da noite, exclusividade dos nossos ouvidos e dos que se encontram ao nosso redor, embalam a conversa que de inicio parecia perra e difícil mas que com o colar dos lábios nos copos em silencio de crime flúi tão levemente que acho que estamos a conversar desde sempre.
Gosto da maneira como me olhas enquanto falas seja de que assunto for, não sei se é uma medalha que trazes da guerra permanecer com a expressão inabalável ou se sou eu que te embalo as estrelas que tens no lugar dos postigos castanhos vidrados da tua alma.
O jeito como seguras os talheres leva-me a calçar a imaginação correndo em busca de como será o teu toque em mim, o murmúrio discreto da faca na carne que podia até ser a minha, e o arrepio que escorre agora frio pela minha pele, a maneira como a comida te permanece imóvel no prato, a delicadeza com que os teus dentes num toque canibal se preocupam em não magoar as paisagens que viste por ai, maldita imaginação de ti, não consigo sequer embrulhar os sorrisos para te os entregar.
Tenho-te guardado no meu peito, ai se tu soubesses como cavalgas na minha mente, se soubesses as vezes que realizo por estares tão preso no meu coração já és um pedaço dele. Os sentimentos tem destas coisas, enganam-nos à medida que crescem como aqueles miúdos a que já lhes falta os dentes e sorriem sem medo das maldades.
Tenho de fazer desde um jantar normal, a comida já me observa com certa duvida se vai ser para hoje ou para os cães famintos que aguardam nas traseiras do restaurante porque ninguém lhes quis a vida, mas os meus olhos famintos das tuas palavras não conseguem se apagar dos teus. Ajeito os pés dentro dos sapatos que trouxe para notares como são bonitos os meus pés quando passearmos no final da noite pelos jardins abandonados desta cidade, não que eu acredite que eles sejam, mas tenho de te fazer acreditar nisso para os quereres negociar, para os colocares em tua casa depois de deitares os sapatos fora, não gostas do supérfluo, e é esta a maneira que tenho de me abstrair do álcool que me obriga mil vezes em cada segundo que morre a pensar como será que vai acabar esta história de sempre.
Tocamo-nos sem um gesto programado para sair bem como no teatro, pareço uma miúda de 12 anos com medo do que vai ser o seu primeiro beijo, tu sorris sei-te culpado, os teus olhos reclamam esse juízo. Já descobriste não sei se nas minhas mãos que embalam um verniz já ressequido, ou se nos meus olhos que parecem duas esferas de fogo cintilante, mas descobriste o almejo que me impulsiona.
Ajeitas a gravata num acto desajeitado, um sufoco para a ocasião porque pareces bem assim e sabes disso, mal tu sabes que poderias estar de pijama com bonecos de uma banda desenhada mal elabora que eu te olharia da mesma forma, com a mesma intensidade.
Quem sabe se um dia numa daquelas noites frias depois de um jantar parecido com este, as nossas personagens não se conhecem num abraço terno num anglo bem elaborado.
Vamos acabar este jantar numa sobremesa de céu decorado de milhares de pirilampos reluzentes explodindo de luz, "com as cabeças juntas, segregando banalidades deliciosas na euforia suave do álcool" porque hoje somos embalados desta maneira que amanha na ressaca nos calará a boca por não haver desculpa de ser sincero.

falta


Sinto-te a falta. Sinto como se tivesse acabado de escrever o teu nome na lista de faltas do supermercado, não precisas de lá estar, no meio dos iogurtes, do leite, do pão, das bolachas, das massas, dos detergentes milagrosos que nos limpam até a alma no seu marketing épico, no meio dos cremes e de todas as coisas que consideramos oxigénio em casa, mas não estás.
Não te posso colocar naquelas linhas destinadas a futilidades, naquele papel pouco digno de histórias, sem alma, roubado a árvores em vida, não te posso fazer isso.
Não te encontro no supermercado, nas montras das lojas, no meio da ultima colecção de um estilista que por acaso era gay, nos corredores dos centros comerciais, nos caixotes de livros, nos mercados, ou até no mercado negro, onde te podia comprar ilegalmente, sem documentos, com uma identidade diferente, em euros ou em dólares.
Porque será que te quero aqui, não existe um motivo, talvez seja uma daquelas doenças que não se sabe de onde vem mas que acabam por ficar, daquelas para as quais não existe remédio, nem comprimidos, nem xaropes, nem gotas, nada.
É estranho, imagino-te nos lugares meus, vejo-te quando a luz começa a fraquejar e me obriga a ajeitar os óculos para a leitura, encontro-te nas páginas dos meus livros, de onde esta saudade forasteira sem sentido se ocupa de me orientar a vida.
Também se apanham doenças nos supermercados? Ou mesmo nas montras das lojas? Onde será que te contrai? Não quero saber, sinto a tua falta que importa o resto? Onde, quando, porquê… o homem perde-se nas interrogações porque não quer correr atrás de respostas.
Sinto a tua falta. Não sei onde te posso adquirir, mas sei onde estás, longe ou perto, entre duas almas unidas não existe distâncias, mas estás. Na minha rua, no meu quarto, no autocarro, no centro comercial, na praia, no café, em Paris… sendo assim, porque sinto eu a tua falta?

A canção tocou na hora errada

A canção tocou na hora errada, a canção que tentei fazer para ti, para não esqueceres que há tempo de sobra para acabares com a solidão. A canção em que me tentei pintar, para que me sentisses o aroma, o sabor, para que me tocasses num acto de loucura e entrega, como só a musica te consegue prender.
Já não sei de que forma foste embora, mas ainda não me cansei de te esperar, da mesma forma que sei que ainda me esperas. Não entendo como esta melodia se pode tornar uma musica de crianças, onde criamos esperanças de voltar para um lugar de onde nunca conseguimos partir, esperamos o que então?
Maior parte das vezes acho que sei tudo, mas quando o assunto és tu, largo as certezas ao vento, já não sei nada, quem sabe assim, a história muda de figura e voltamos ao que nunca deixamos de ser.
Durante tantas noites adormeci a pensar que no dia seguinte iria aninhar-me em ti e contar-te todas as aventuras por que passei, dizer-te que me fazes falta mesmo estando sempre comigo, e tu ias me receber de braços abertos e encher-me de beijos, ia ser de novo a tua menina, mas nada mudou nos dias seguintes, nos anos seguintes.
Por isso tentei fazer-te uma canção, numa tentativa frustrada de te ter novamente na mão, mas o tempo levou tudo e fiquei sozinha com a minha canção. É por isso que continuo a aperfeiçoar a melodia, os acordes, e as palavras que sei que guardarás no coração, onde eu já estive, onde fui a tua musica, até me perder no meio de nada, até te perder onde não havia nada.
Tantos caminhos sem fim e por onde não voltas, numa encruzilhada onde fomos deixados pela vida com uma ideia somente na cabeça: regressar.
Não posso colocar-te palavras na boca, nem no coração, mas quase juraria que existe ainda qualquer coisa, sinto-o no teu olhar, sinto-o quando te encontro, sinto-o até em todas as memorias que evocamos, sinto porque foste tu quem me fez tocar no céu. Num sentimento tão puro, tão real, tão cheio de tudo, o lugar mais alto do universo onde cheguei, de onde caímos, mas onde estivemos juntos. Será que eras capaz de chegar lá de novo?
Entrego-te as palavras, agora junta-as à melodia do que vivemos, sei que das tuas mãos saíram os acordes, e aqui tens a canção que um dia fiz para ti, para descrever aquilo que já sabes, aquilo que sentes, como eu gosto de ti…
O pedaço que um dia me roubas-te ninguém te tirará…

sábado, janeiro 14, 2006

We have no more beginnings
We meet end to end
I know that I have lost you
When I think of the way we used to be
I wanna be just like that again
to find it again this feeling we had
I need it again I'll make it last

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Carta que nunca leste


Poderia começar esta carta de um modo normal, mas as circunstâncias em que me encontro não me permitem começar por aquela típica abordagem que raspa em sentimentos chegando ao abismo de se tornar banalidade.
Não te quero falar de coisas fugazes, de nevoeiros matinais que escondem dias soalheiros, não te quero contar novidades que não te importam, quero apenas falar-te de modo sereno, como se tivesse acabado de me aninhar em ti para ficar a contemplar o teu sorriso.
Confesso que tive medo de me perder contigo, era um mundo tão fantasioso que até mesmo eu que gosto de andar pendurada em fios de estrelas, e varinhas de condão, tive medo de abrir as asas. Mas tu mostraste que não havia nada a perder, e que mesmo quando se está preso a uma vida, existem coisas que tem dons de nos soltar, nem que seja por momentos, e é ai que somos livres.
Éramos nós, na mais pura das essências, no estado mais natural, e pensava eu recordar todas as sensações conquistadas até ai, mas parece que a abstracção ou a intromissão foi tal que hoje não te recordo em lado algum.
Não existem muros, nem palavras, nem ninguém, só aquilo que nos brilha cá dentro, como se durante umas piscadelas do relógio, se abrisse no mundo uma porta onde nos podemos esconder de tudo, para nascer numa nova vida.
Entrei numa história que julguei não saber como era, e hoje digo-te que continuo sem saber como cheguei perto de ti, sem deixar rasto, sem soltar uma única palavra ao vento.
Era o segredo, o nosso segredo, e ainda hoje quando passeio pela cidade sinto que de alguma forma ainda estás comigo, na brisa que se aninha nos meus cabelos, na luz que me atinge com toda a força, ou até mesmo no nada com que vivo constantemente.
São assim fortes, intensos e permanentes os momentos que vivi, agarrada a sensações que depois vi fugir, sem deixarem recado. Fizeste de mim lua, estrela, e mesmo sol em plena meia da noite, pois foi dona do céu que perdi, fui mulher, fui tudo quando não havia nada se não incertezas.
Mas tal como a noite não é eterna, sei que até os meus pensamentos tem prioridades que os impedem de continuar, pé ante pé, nessa linha imaginária a que chamaram infinito, onde me fui perder na tua imaginação.
Não te preocupes se os meus pensamentos te parecem confusos, pois sabes bem que consigo viver no meio do caus, do ser e não ser, do eu e tu…desculpa não era isto que queria dizer-te hoje e aqui, não existe nada para além de nós, só um infinito para desbravar, mas intacto.
Hoje não quero que te lembres de mim como momento, como passado que recordas por dar jeito para a ocasião, como pedaço de tempo onde te perdes, quero somente que me incluas no passado, no presente e no futuro, e acredita que nada mais simples consigo pedir-te.
Quero que tu em mim, sejas o passado de algo que já foi, o presente que está sempre comigo, e o futuro que estará sempre lá, pois não existem pessoas que passaram na nossa vida, existem aqueles que fizeram de nós seres humanos, e os que se limitaram a assistir.
Aqueles que existiram mesmo durante uma volta curta do relógio, mas que deixaram algo capaz de fazer brilhar os olhos, a força que pode fazer qualquer um mudar o mundo. Pois é, nem toda a energia e felicidade que canalizei serve para alterar destinos, mas tu já fizeste o suficiente para mudar o meu, e é com essa mudança que sigo em frente pensando que o mundo está em constante movimento, e não é por termos saltado para fora dele em momentos de loucura que ele vai parar de girar.
Escrevo-te hoje, não em sinal de despedida, porque só sai das nossas vidas quem nós queremos que não permaneça por lá, mas em sinal de agradecimento pela presença sempre presente, nos momentos de todos os dias e pela luz que me dás com esse sorriso mesmo não estando.
De coração hoje e sempre,
Joana

terça-feira, janeiro 10, 2006

Despedidas ( o recordar)

Odeio despedidas, são coisas impessoais, um modo falso e alegre de deixar partir sem dor quem se gosta. Ninguém considera a partida do que não se perde nos seus pensamentos. Sem laços não existem despedidas.
As palavras saem cruas, apertamo-las nas mãos até as pontas dos dedos ficarem brancas, e o resto da mão adquirir uma tonalidade rosa, para não as deixarmos envolver quem parte,
(Não sou egoísta. Não sou egoísta. Não sou egoísta.)
Não queremos provocar dor naqueles que nos podem levar, na algibeira, na mala, ou mesmo no pensamento, ou em outros lugares mais profundos onde ninguém nos pode arrancar.
Senti-te a fugir, como se fechasses sem eu notar a porta aos poucos, agora só te consigo distinguir as formas na penumbra, não nos queremos comprometer com palavras, não queremos que seja assim.
(Leva-me contigo. Leva-me contigo. Leva-me contigo.)
Sei que não queres nada disto, é impessoal, tem de ser impessoal, não podemos deixar dor, não queremos deixar nada a doer, nada vazio, nada com vontade de ficar. Sei que não és assim, mas tem de ser. Apertas as palavras na mão como se tivesses as mãos a sufocar-te a garganta. Vou fazer o mesmo., por mim, por ti.
(Porque partes? Porque partes? Porque partes?)
Não sabes já qual das mãos me hás-de dar, sentes que preciso de amparo, mas tens as mãos ocupadas a segurarem-te a as palavras que não queres que saiam, tens as mãos a sufocarem-te o grito.
Não quero despedir-me de ti, não vais fugir, não vais morrer, não vais mudar de universo, vais de viagem. Comboio, avião. Muito diferente.
(Voltas? Voltas? Voltas?)
O relógio perde-se nas despedidas, prende-se com a tua partida, como se o sol trocasse o passo ao som de uma valsa, não sei quando voltas.
(Será que voltas? Será que voltas? Será que voltas?)
Espero. Desespero. Talvez.
Mas não me preocupo, a minha asa vai contigo, acabou de se esconder dentro da tua mala enquanto atento, os teus olhos seguiam toda esta reprodução de letras que se cospem uma a uma de forma a haver melodia. Harmonia. Poderás sempre voar se necessário, poderás sempre perder-te, poderás encontrar-te nesta viagem tão tua, só tua.

quarta-feira, outubro 26, 2005

continuação..Porque o fim é meramente artificial...tudo o que se recorda nunca acaba...


Já sei, já sei não precisa de reclamar pela minha atenção protestando mais uma vez que só falo em solidão nos capítulos que se estendem como estradas por caminhos que não são meus nem conheço dono, mas sabe como são as mulheres falam de tudo desbocadas, eu desconfio da minha condição feminina mas com certeza é um recalcamento por quererem constantemente mostrar que tem uma boca carnuda para ser beijada a todas as horas e ainda a qualquer altura, gosto de chamar-lhe o recalcamento do baton de rosas (haverão rosas de todas as cores para encher as bocas das mulheres desta maneira com tantas palavras?) ser sociável sem cura e sem outro modo de invenção, infelizmente somos tão mas tão sociais que damos por nós a correr umas atrás das outras como se houvesse uma bomba ou um avião a despenhar-se lá atrás onde as suas costas já não alcançam a tragédia porque desistiu muito novo em olhar para a frente da vida que tem nas costas, como se o passado tivesse deixado de escrever-lhe depois das férias de verão passadas em lugares que não lembram a ninguém conhecer., a culpa é de termos sido bem tratadas enquanto princesas e esbofeteadas enquanto escravas porque não nos ensinaram a viver no meio-termo, penduradas pelos pescoços esguios na corda bamba onde outros em truques e equilíbrios duvidosos se mostravam detentores de um poder que não lhes pertencia, mas não culpo os homens, nós só nos arrastamos porque queremos atrás dos vossos pés grandes de modo a ocupar toda a terra que vos pertence e digo-lhe em tom de preocupação tenho medo do lugar onde vai descambar esta enxurrada de gente que corre sem sentido pelos caminhos já pisados pelos outros, desconhecendo o sentir da terra húmida debaixo dos pés virgem de outros calores que não os seus, os seus pés, coçados pelas pedras de viagens onde me perdeu, onde me julgou encontrar tão profundamente que até sinto hoje a falta do sol lambendo aquele circulo branco em volta deste dedo que tenho na mão esquerda, mas não me ligue que hoje estou carente de afectos, de mãos enlaçadas de nós em cabelos frágeis e escovados num vagar nunca antes encontrado num beijo demorado de escova, de pescoços coçados por lábios meio húmidos das palavras que se disseram muito lentamente aos ouvidos de quem se tem por perto, e as mãos que abraçam afagos de corpos corroídos dos ácidos da vida. Não sei se será compreensível o que me deixa assim neste estado sentimental que tanto me lembra os dias cinzentos de Outono que se passa pendurada à janela como se tivéssemos noticias de ninguém quase e mesmo a chegar, bebendo chá em goles quentes para enganar o frio e os arrepios de vazio que sobem pelos braços acima como um raio de luz, aquele respirar mansinho que sente debaixo da camisola gorda de quente no Inverno a força explosiva de um jacto de partículas, uma ou duas apenas de oxigénio e outros resíduos gasosos simbolicamente agregados em moléculas daquelas engraçadas que se estudam na química que fazem levantar um campo de trigo quando o vento deixou de soprar somos antíteses de campos de trigo quando sentimos o vento a chegar e a levantar todas as espigas da pele. Eu gosto de arrepios, acho sensual e acho que é uma maneira do que sentimos cá dentro sair pelos poros deve ser por ai que os nossos sentimentos chegam ao exterior, quando as espigas de trigo vergadas pelo peso da falta de ar de um momento para o outro se levantam e tentam fazer frente aos sopros às palavras e às notícias que se ouvem sem esperar.
Sabe esta conversa de arrepios e trigo deu me volta ao apetite e apetecia-me agora mesmo por me bonita agarrar num casaco caso a noite fosse terminar tarde e sair para jantar depois de um convite seu, tem cinco minutos para bater à porta ou ligar, já sabe que deixo o tempo a contar devagarinho para lhe dar tempo de algum atraso desnecessário para mim mas que até posso achar piada depois, não me vá eu perder de amores a olhar para o espelho tentando que os meus olhos sejam os seus, delineando gestos e olhares para que me coloque em cima da mesa mesmo antes da refeição começar, não precisa de dizer já sei que depois de lhe ter dado este toque de impessoalidade com a terceira pessoa nem sequer devia pensar em tal disparate, mas assim sendo acho que não vale a pena dormir sobre o que já foi escrito e vou deixar do "você".

terça-feira, outubro 18, 2005

A cidade suga-me a alma

A cidade suga-me a alma a cada instante que passa mal calculado no relógio que se ganhou nas férias pelas obrigações bem concebidas, os transportes esmagam-me contra os caminhos longos a percorrer em busca de um outro alguém ou de mim mesma, os caminhos estão compassados no tempo e tudo acontece na hora errada, o sermão à noite e de manha como os padres nossos e as avés marias certas no olhar dos velhos colados no tecto dos quartos imundos onde se descobrem as vergonhas e as verdades, as fragilidades. Toda a felicidade acaba porque não há felicidade há sim momentos felizes como este ou aquele que passou que ficava bem nas fotografias se as tivessemos tirado, mas a memória falha como os riscos nos discos que engasgam as músicas das vozes das pessoas. Não se pode falar de musica é arte, não se pode falar de teatro, ou de literatura a mamã não gosta que a pequenina siga os caminhos dos espectáculos porque só existe gente vigarista ,balbucia ela a jeito de ser ouvida bem cá no fundo, só gente vigarista. Sabe apetecia-me perguntar as pessoas que encontrar amanha nas rodas com bancos onde se enlatam pessoas vivas (não tem medo disso mamã?) se algum deles é vigarista, se encontar um vigarista que será que tem ele para me oferecer, os politicos oferecem e são vigaristas, também farão eles parte do espectaculo? Porque será que se desacredita quem pensa diferente, quem pensa pelos outros que nada fazem, porque será que não há lugar como nos autocarros onde por vezes se faz malabarismos nos corredores, um jogo do segura aqui segura ali, perna direita para a frente perna direita para trás, próxima estação cidade universitária, e lá saem os carneirinhos atrás de alguém que perdeu a fé atrás de uma secretária e se dedica a ensinar vigarices como diz a mamã.
Mamã eu ouvi lá no fundo e sabe, a cidade suga-me a alma.

sábado, outubro 15, 2005

Eu ou Eu

No vazio da poça de àgua criada nos lugares para inundar qualquer coisa que diluísse as dores como curaram as dores da terra criando os oceanos, os ressentimentos aumentam mas as emoções não crescem na terra envenenada para nos mudar os caminhos tomando estradas diferentes Quando o fio das leis quebrar sem justiça que número de trapezistas amadores faremos nós enrolando os pés feridos pela corda que arrancamos sem piedade dos dias, não podemos cair não podemos cair pára de chorar não podemos cair não podemos cair, dá me a tua mão isso mesmo eu sabia que eras capaz não podíamos cair, nas armadilhas no chão molhado no beijo apressado nas poças de água sujas de nós, anda não podemos parar sim más rápido até sentires que o teu coração se esqueceu de avançar uma nota no compasso ai será bom já não sentes nada, mais rápido não pares corre não me ouves rápido não ouves já as vozes atrás de nós mesmo quase a chegar aqui, eles vão nos apanhar aqui e pensar eles pensam sempre em tudo e em todos porque fazemos porque não fizemos se vamos fazer outra vez se vamos continuar ou se vamos parar porque não sabemos por onde seguir, e tu que fazes? Não digas nada eu sei que nos podes esmagar como se fossemos insectos nojentos e pouco alados das patas daqueles que rastejam por todos os lugares aos pés dos outros a vida inteira, eu sei, que podes acabar connosco como se nada tivesse acontecido sem fechares os olhos sem pestanejar sem chorar sem piedade sem nada porque esquecias assim rapidamente, eu sei que podias, até matar tudo o que somos por sermos tão frágeis e tão vulneráveis mas anda não falemos mais nisso mais depressa não entendes que eles vêm ai a correr não sentes no chão o ruir da sua passagem mais rápido cala-te corre cala-te anda, será que eras mesmo capaz de matar de deixar que o metal rodasse uma circunferência tosca na cabeça conseguias olhar o meu dançar bailado de forças que se escorrem como chuva no corpo que seria mesmo só um corpo terias coragem de me deitar pela ultima vez no chão desta vez sem desejo nem paixão, nem quero pensar não me distraias não me mantenhas à parte do mundo que aborrecimento, volta a segurar na minha mão vá anda com força, concordo que as vezes nem temos razões para encarar a solidão deixamo-nos levar como tu agora pela minha mão enquanto coordeno o falar com os passos desajeitados dentro dos sapatos que me magoam imenso o chão que piso, sabes vou fazer de conta que acredito nesse teu olhar solene para a ocasião que quase me diz tanta coisa como eu que nada te digo a ti não te faltam as palavras só as significações mas estás perdida, agora não aqui comigo já te disse para não chorares, cala-te e acende uma vela assim que a luz chegue para te esgueirar a iluminação no rosto para vislumbrares o medo que te sombreia o rosto que horror de se ver procura lá a vela só na escuridão o sofrimento faz sentido procura a luz não me obrigues a gritar levanta-te dessa poça vais ficar doente de ti, estou a ouvir a tua voz lá longe não te percas, ainda sinto a temperatura da tua mão na minha não pares de andar, não deixes que a água faça parte de ti não carregues o passado molhados nos trajes que te impedem de correr despe-te está a percorrer-te o corpo todo despe-te já, imagino os fungos das sombras e das humidades a aglomerados a brotarem-te dos poros, despe-te foge salva-te ainda tens espaço no tempo, já ouço os passos deles perto o barulho a ruir na minha cabeça não consigo ouvir-te andar os pés pesam no pânico eu sei que é ele, pânico, milhares e milhares de gemidos e uivos rastejados todos ao mesmo tempo e saltam e rasgam as roupas e fazem tanto barulho, ai a minha cabeça eles chegaram corre salva-te a arma está carregada salva-te, calem-se calem-se calem-se deixem-me escutar os passos de um silencio que não chega parem já não estamos sozinhos, tenho a arma carregada acaba com isto salva-te, mas mas mas tu és eu vejo-me em ti és tu sou eu em ti sou eu, salva-te dispara, não me mates.


{acabei de me perder de mim...}

terça-feira, outubro 11, 2005

Lanterna


Lanterna. Lanterna seria um belo nome comum para ti, uma luz pequena meio tosca que muda cortinas de cenários escuros de tanto negro trazido ás costas como carvão saído de uma mina pelo final do dia, lanterna foi aquilo que foste aquilo que és e que até poderias ser, fazes sentido na noite fazes sentido na representação de uma vida fria no meio dos vazios e dos nadas onde poderia haver tudo.
Aquele lusco-fusco que nos assume os contornos que nos faz diminuir o tamanho das retinas aguçadas pelas lágrimas trazidas pela escuridão insignificantemente porque é na noite que a luz faz sentido que a noite deixa de ser noite e se torna mais mulher mais sexual, mas tu és luz não luz em exagero que faz colocar as mãos como refugio de um rosto sujo onde se notam imperfeições de humanos que fazem de gente sem saber sequer os papeis, és uma luz que deixa alcançar em profundidade as horas corridas não os contornos mas sim as sombras, o que está implícito nas palavras que nunca se ouvem que podiam ser escritas, cantadas, sussurradas, gritadas, sufocadas, mas que são somente oferecidas como presente de laço e papel às cores, um presente que pode ser tão bom e tão mau.
Lanterna mas uma lanterna velha onde se colocam velas presas em cera liquida e quente pelos pés para não perderem o equilíbrio como se faz com as pessoas que andam distraídas de si mesmas, colam-se-lhes os pés no chão da vida para verem o espectáculo até ao fim sem se moverem porque a realidade é um filme para o qual não é necessário tempo para a fila das bilheteiras, a realidade é grátis e obrigatória e mais tarde ou mais cedo todos nos vamos ver nela, uma estrutura de ferro para a luz não se apagar com o violente passar das coisas fugazes e rápidas que escorrem como areia pelas mãos tanta é a que caía mas tão incomoda é a que resta e se agrega em nós como postal barato de recordações efémeras que se cola nessas paredes translúcidas porque até a alma é transparente como as garrafas depois de bebidas onde se encontra o outro lado, como as janelas das paredes que mostram o outro lado o que há depois de tudo, das construções frágeis, dos baldes de massa desfeitos em perpendicularidades e do suor de Inverno que leva comida as bocas ansiosas.
És uma lanterna que serve somente para iluminar noite e dias que ilumina as folhas a serem escritas como esta agora mesmo que haja sol lá fora para vender ou para comprar, iluminas sorrisos dos quais já te esqueceste por teres ouvido as palavras entoadas que não deviam ter nunca nascido, tal como os actos e as aves e os outros animais, os pequenos os grandes, as casas as ruas as vidas as pessoas os papeis a escrita os carros o ar o sol as partículas, nada. Nada disto devia ter sido concebido porque assim a vida seria fácil porque não existiria vida, nem lanternas.
Não faças barulho, quero saber qual é o tom com que se pronuncia a efemeridade deixa-me ouvir a lanterna a queimar a luz que vai apagar.

sábado, outubro 08, 2005

A ultima letra



Ao virar a última página coberta com o pó dos tempos deparei-me com o teu nome já meio apagado pelo devorar inexorável das horas que escorrem entre-dedos.
Não sei o nome de livro nem de autor. Ambos se evaporaram no éter deixando marcas de um ventre aberto onde te deixo repousar e adormecer.
Agora resta a poeira dos dias e noites e o esquecimento no sótão das minhas lembranças.
[A última letra] que eu já nem sei qual é porque perdi todo o sentido de identidade.
Em suspensão vejo-te a pairares qual fantasma benigno em volta de mim, como uma mariposa que haverá de mudar de forma.
[Gosto do negro que criaste e do som etéreo que dele emana, criando um ambiente que rotulo de uma outra dimensão]
Esventrado, sem pinga visível de sangue sustenho o teu respirar que se faz monocórdico e ritmado, ao mesmo tempo que o rosto adquire tons de serenidade que te não conheço quando acordada.
O respirar que se me tornou imprescindível que me rasga ventre, alma, me despoja e ao mesmo tempo me enriquece sentidos, é-me assimilado pelo toque inexistente de longos cabelos macios e calor de boca entreaberta e lábios molhados. [Desejo?] pergunto-me já que o não acordar-te se me tornou impossível.
[Desejo sim] vou imaginando enquanto o teu peito sobe e desce de forma cadenciada marcando as horas e o pó que se acumulará no livro sem nome nem autor.
Sei-o de lombada negra, agora já não tão negra por força de uma poeira esbranquiçada que são as memórias que ambos tentamos apagar sem êxito.
Sei-te em silêncio mas não o entendo.
Apenas de quando em vez uma pequena mensagem ou uma frase furtiva curta, idiossincrática.
Confuso, traçando alquimias estranhas que não buscam ouro mas a ti.
[Tento em vão ler nesse silêncio que não entendo]
De novo em suspensão e imaterializada, ausente de sons, presente muito raramente em pequenas mensagens contendo caracteres que não entendo.
Essa ausência de mim conduz-me à abissal ausência de ti, presente apenas na forte inexistência dos sentidos…


{Não é meu, mas também não sei quem escreveu...só sei que adoro}

sexta-feira, outubro 07, 2005

Ressuscitou

O blog não morreu, apenas não resistiu a um ataque de cólera....