segunda-feira, fevereiro 13, 2006

Não estás

Sábado à noite. Passaram apenas uns minutos desde que me deixaste aqui perdida em pensamentos encostada à janela onde o teu reflexo é ainda visível. Vi-te chegar lá em baixo, vi-te procurar a chave duas vezes nos bolsos, vi-te a sorrir-me, e vi-te ainda a entrar no carro e a partir. Apetecia-me correr atrás de ti, mesmo nestes trajes de trazer por casa e gritar com todas as minhas forças para não partires. O tempo saqueou me o coração e levou-me com ele a viajar por todos os minutos antes, quando entraste em minha casa, quando pousaste o casaco sobre o sofá, quando olhaste para o fogão e pensaste que estaria eu a fazer, quando me encontraste descansada de um dia no sofá. Pausa. Deixo-me ficar presa naquele instante preso na minha memória, vejo-te encostado a mim, beijaste-me, juro que conseguiria ficar presa naquele instante eternamente se não fosse esse inútil do tempo, que me apaga os momentos, que me faz ir até a solidão todas as noites só por capricho, quando eu queria era voltar atrás.
Deixo a memória rolar. Play. Sentaste-te a meu lado deixaste que me aninhasse nos teus baços e ficamos ali como se fossemos obrigados a sentir os nossos corpos colados, como se fosse um castigo sentir-me protegida, ter-te junto a mim, como se houvesse alguma coisa que nos unia, e nos fazia querer ficar, agora sempre, e para sempre. Pausa. Corro para o sofá, o teu cheiro está lá, tão presente, há restos de amor e de solidão, e tu tão distante, quem me dera ter-te de novo comigo, dormir no teu abraço, fazer parte de ti. As memórias daquela noite continuam a percorrer-me os sentidos, o corpo não resiste, aninhada na solidão e no silêncio, deixo-me levar pelo sono.
O amor é a poesia da sabedoria, quando acaba todas frases fazem sentido, todos os gestos tem finalmente uma resposta, e tudo porque acaba a aula e podes colocar em prática o que viveste. O amor só faz sentido quando termina. Só ai consegues tirar a venda dos olhos e ver realmente o que tocaste, por onde passaste, e até onde te perdeste tantas vezes, sem quereres saber quem era, o que fazias, quem eras tu ali.
Aproveito-me desta cegueira temporária para poder errar na razão, para justificar os meus actos meio tresloucados, para poder ser eu, mas contigo.
Um sonho desperta-me de novo, chamo por ti. Não estás.

Sem comentários: