quinta-feira, março 29, 2007


Falta de coisas inesperadas na vida. Quero que a falta de coragem não seja um mal crónico.
Não me vou voltar a esconder atrás do nada, nem seguir em frente de cabeça no chão.

domingo, março 25, 2007

Fim do Mundo


Um dia no meio de um problema ou no meio de um nada, de um vazio, a linha da vida será cortada pelas mãos massacradas que ninguém agarrou.
Que a faca não seja precisa para tirar a vida àqueles que um dia ousaram amar distraídos, que seja a alma amachucada a definhar lá dentro, que lhes tire a cada dia que passa os movimentos, a agilidade, os sentidos, a vida que querem viver com vontade de morrer.
Que se encoste um ferro quente na pele, fundindo a dor de uma vez por todas no corpo até ela chegar à alma. Que essa dor transforme quem a sofrer para sempre, e que a feche de uma vez por todas aos afectos.
Que os melancólicos fiquem para sempre sozinhos com a sua tristeza, dentro de quadrados assimétricos, enquanto os pianos e os violinos lhes arrancam a solidão à dentada das suas cabeças.
Que nos corações de quem não ama, nasça uma árvore sem frutos nem flores, uma árvore sem folhas, uma árvore que não é nada, que não serve para nada, para que eles se sintam preenchidos no espaço para sempre condenado ao vazio.
Que se deixem ficar quietos os que tem a cabeça a andar às voltas, agitados e confusos, enquanto vêm círculos a moverem-se nas paredes; que se deixem a enlouquecer os que se julgam donos das certezas, que o delírio lhes anule toda a razão.
Num lugar branco e claro, que se abram os olhos daqueles que tudo quiseram ver, seja a ametropia a sua doença enquanto os seus olhos ardem; que se oiça uma música alegre e os pensamentos por si processados sejam gritados até eles caírem sem reacção.
Que se cortem as mãos a quem escreve, que se lhes retirem os olhos para que mais nenhuma linha seja lida, que lhes arranquem os ouvidos para não poderem jamais compreender as novas história, que lhes arranquem a língua para que nunca mais envenenem a mente dos que sempre quiseram escrever e ser génios.
Que a justiça seja uma palavra com um significado justo e imutável na mente de todos os anormais, que se encham todos os rostos com um sorriso estúpido, e que toda a gente seja ignorantemente feliz. Que ninguém seja condenado por ser maravilhosamente cruel, por ser fantasticamente louco, ou por ser simplesmente morto dos estímulos do mundo real.
Que a marcha nupcial seja trocada pelo Requiem de Mozart, e que ninguém case por amor, mas por ódio ao outro com quem terá de conviver até converter todo esse sentimento em acção.
Que a música não seja somente um barulho, mas a energia ejaculada pela terra para dentro de nós, que seja mais que um motivo para pessoas sem cérebro agitarem os corpos suados para obterem sexo, que seja fonte de amenomania.
Que a imaginação seja um lugar possível de habitar, onde tudo é fabuloso e funesto, onde se pode encostar a cabeça e dormir sobre o que se ve dentro do corpo, onde a alma é mais que uma extensão de nós mesmos, onde tem um corpo sem roupas, sem frio e sem calor.
Que o sexo se faça somente com a cabeça, que seja mais que uma causa de desgaste de corpos devido ao atrito, que seja um estado de pura alegria e êxtase equivalente ao conhecimento de muitas teorias.
Que habitem aqui, seres desconhecidos que sofram de desconfiança crónica para com os outros, que sejam observados, subestimamos, provocados, humilhados, controlados e traídos pelas suas próprias alucinações, e que se escrevam as mais interessantes histórias sobre eles.
Que o suicídio seja a morte natural de todos os que recorrem sem intenção à vida, que dela sejam donos, e que a morte não seja mais que um orgasmo inversamente proporcional à existência, e à razão sensível.
Que não se sofra nunca mais de neurastenia, que tudo seja irritantemente perverso e soez, que os olhos ao se abrirem não consigam ver mais nada que desgraça.
Que todo este orgulho e tristeza me derrubem sobre os joelhos, com a cabeça baixa em direcção ao centro da terra, que me amarrem as mãos e me tapem os olhos, que me vejam os lábios com desdém sempre que deles saírem ideias absurdas.


Quando o mundo acabar, fecharei a porta e no escuro procurarei alguém igualmente estranho que me faça cócegas no coração.

segunda-feira, março 19, 2007

Na noite


Era noite e apenas se ouviam os passos que iam ficando para trás, enquanto avançava no tempo e nos momentos. O vento soprava sem nenhum murmúrio agregado, e fazia com que os olhos se abrissem ainda mais, abriam-se para a escuridão que descia em estado líquido pelas paredes,e que cobria o alcatrão negro do caminho. A lua estava acessa, mas mínguava tal como as suas vontades de ver fosse o que fosse. Estava frio, e por isso escondia as mãos nos bolsos, não por isso, mas pelo medo de um tocar sentimental que envolvesse toda a sua existência. De mãos nos bolsos pisava a noite sem destino,sem nada que conduzissea sua pessoa a algum lugar, ou a lugar nenhum. Não havia um rumo, mas havia muitas ideias que baloiçavam como que nos fios de cabelo, para cá e para lá, ao compasso dissonante do vento. Ali repousava naquele caminhar, tal como sempre, tal e qual todos os dias, as ruas estavam húmidas e o que restava da lua criava um cenário de espelhos que reflectiam a sua mentira aparente, o seu corpo imundo do mundo, da sua alma suja. Não olhava os espelhos, não queria conhecer a figura que se encontra por de trás do reflexo.
Como uma espécie de passageiro da noite segue em busca de qualquer coisa, não de uma coisa qualquer, conforto, calor, carinho, carência, castigo, cartas, uma casa. Observa a sua cabeça por dentro, mistura as imagens vividas, com as imagens por morrer; tem um frasco dentro da cabeça que contém uma figura alada e incipiente. É a esse ser que dá atenção, é a esse ser que cruelmente tira as asas ao anoitecer, enquanto ri sem parar criando uma alienação da sua realidade, entrando no outro mundo que também é o seu.
Agora trás consigo essa figura, que dentro de uma melancolia eterna chora lágrimas com dor. É àquela miudeza que que mostra a escuridão da noite, a solidão, enquanto vazio de emoções segue somente por seguir o caminho, a que a noite o conduz.
Sente-se livre de tudo, da crueldade de viver, da dor que queimou não no peito, mas no corpo por inteiro, da alquimia com outros distantes, da experimentação megalomana dos sentimentos. Finalmente, no final do dia é livre e não é nada, simplesmenta nada e invisível, no silêncio e no escuro da noite. Ouve sem parar o barulho daquele pequeno corpo que, dentro da garrafa bate com os punhos no vidro por não conseguir voar. Sem asas, coloca nas mãos do ser que tem dentro de si, uma arma fria e carregada, pronta a disparar.
Há uma explosão de adrenalina, hoje alguém vai ser tudo, hoje alguém vai ser livre e voar pelas próprias asas.

sábado, março 17, 2007


Lava-me e esfrega-me a alma também.
Dá-me a tua mão para que possa criar em mim uma ilusão de sentir-te. Deixa que os meus dedos se interlassem nos teus criando uma força inerte e invisível, uma barreira às coisas que são más, e às coisas que não o são.
A ilusão de um sentimento casto e irrefutável turva-me os sentidos magoa-me a existência de mim mesma. A ilusão faz-me doer a cabeça. A dor dá-me a vida que os sentimentos me tiram, os bons sentimentos, as coisas realmente importantes que não sei definir em palavras, por, talvez, não terem na sua realidade, importância nenhuma.
Há uma força em mim que puxa cá para fora, que desmembra de mim, pequenos pedaços e os deixa soltos, como papéis ao vento. Força essa que me cria a esperança de um dia me sentir realmente viva, sem nada entro de mim, e com tudo à minha volta.
Um dia quando morrer quero-me transformar em pequenas cartas, de amor, de suicidio, de despedida, de revolta. Cartas que nunca foram entregues, cartas sem destinatário, cartas por terminar, palavras sinceras, fortes e poderosas, carregadas de uma energia destrutiva. Mas não serão apenas cartas, serão pessoas, as que não tem mãos para dar forma às letras, aquelas que escrevem na cabeça linhas e linhas, histórias só delas, buracos de uma existência sem corpo, sem realidade.
Quando morrer, serei livre do fardo que carrego em mim, os segredos dos outros que me habitam serão finalmente revelados, e todas as histórias terão um fim igual ao meu.
Vou escrever sobre pessoas, umas verdadeiras, outras verdadeiras mas não reais. Vou estudar os livros que os outros trazem nos olhos e nas mãos, ver-lhes a essência de existir, já que eu não o faço. Não consigo ser una, não consigo ser só eu, há sempre uma multidão dentro de mim. Uns que choram, uns que são maus, e poucos outros, que se transformam numa mentira negando a sua presença através do meu sorriso.
São eles que escrevem todas as cartas, sem mãos, só com a cabeça. Eles que são o meu todo, por completo, eles que não tem corpo, e que me usam a mim para escrever cartas sem remetente, cartas que escrevo com as minhas mãos em sofrimento, enquanto despejo a alma.

sábado, março 10, 2007

Novelo

Palavra Solta,
Veneno tomado à colher,
Doce revolta,
Vem ai mais uma palavra torta.
Quem me dera ter a mão morta,
Para não escrever poemas assim.
(...)

sexta-feira, março 09, 2007

Do outro lado da Janela da imaginação

Apartir de um interesse pouco interessante construiram-se casas sobre a terra, muitas casas alinhadas como se fossem caixotes em armários. Cada casa continha uma pessoa, uma cama, uma mesa, e uma folha de papel, como se fosse uma casa de bonecas sem mais artificios superfulos, para brincar basta a imaginação.
As pessoas que viviam nessas casas, dormiam duas horas, nem na noite nem no dia, dormiam quando tinham que dormir. Lá no sitio onde havia casas, não existia tempo, nem noite nem dia, era por isso que ninguém tinha relógios em casa.
As Casas eram pequenas, apenas se podiam dar dez passos para cima, vinte para um lado e quinze para o outro. Sim, lá dentro, as pessoas podiam dar passos para onde quisessem, não estavam limitadas a andar para a frente e para trás, ao contrário de nós, o limite deles era mesmo o chão. Apartir dai já não havia mais nada.
As pessoas acordavam e sentavam-se debaixo da mesa, com medo. As pessoas das casas de bonecas tinham medo daquilo que existia depois das portas de casa e por isso escondiam-se. Tinham medo também da folha de papel, não tinham com o que escrever ou pintar, e por isso tinham medo do poder da folha, medo que quando se chegassem perto as palavras ou as figuras aparecessem subitamente e transformassem toda a sua vida.
Viviam assustadas e olhavam-se nos olhos quando iam as janelas, uma janela em cada parede estabelecia a ponte imaginária entre a sua cabeça e a cabeça da pessoa da casa ao lado. As paredes eram meramente imaginárias, mas havia janelas reais, com vidros e madeiras a segurarem os vidros. Janelas suspensas por onde espreitavam, mesmo sabendo que não havia paredes, porque era assim que criavam o seu espaço periferico de intimidade. Espaço esse que não existia.