domingo, abril 12, 2009

Me, Myself, and my heart.


O meu coração já se partiu,
já caiu ao chão, já se perdeu, já andou por onde não devia.
O meu coração já se colou, já juntou todos os pedaços,
já cresceu, apertou e mirrou.
De todos os pedaços de que é feito, conheço-lhe as formas,
os aromas e as cores. De todas as mãos que o ajudaram a construir,
conheço-lhes os traços e recordo-lhes as expressões eternas.
O meu coração é feito de momentos, de retalhos de vida,
pedaços colados, cosidos, mal encaixados, outros bordados.
Ainda assim, este amontoado de vida continua a funcionar.
Mesmo cheio de defeitos lamexas, este coração ainda trepida.
O meu coração já sabe de cor o nome do amor,
mesmo que as palavras mudem e os rostos se alterem,
existe sempre uma arritmia de ritmo diferente que o faz cair de novo,
em um novo sorriso, numa nova promessa, num novo caminho,
seguida de uma turbulenta aterragem.
O meu coração não se cansa de voar, mesmo sabendo que muita coisa
provavelmente ficará longe de se encontrar.

domingo, abril 05, 2009

Mensagem do Dia Mundial Do Teatro 2009


Dia Mundial do teatro foi criado pelo ITI -Instituto Internacional de Teatro/UNESCOAugusto Boal (Encenador e Teórico Brasileiro, criador do Teatro do Oprimido)


Todas as sociedades humanas são espetaculares no seu quotidiano e produzem espectáculos em momentos especiais. São espetaculares como forma de organização social e produzem espetáculos como este que vocês vieram ver.Mesmo quando inconscientes, as relações humanas são estruturadas de forma teatral: o uso do espaço, a linguagem do corpo, a escolha das palavras e a modulação das vozes, o confronto de ideias e paixões, tudo aquilo que fazemos no palco fazemos sempre nas nossas vidas: nós somos teatro!Não só os casamentos e funerais são espetáculos, mas também os rituais quotidianos, que por sua familiaridade, não nos chegam à consciência. Não só rituais de pompa, mas também o café da manhã e os bons-dias, tímidos namoros e grandes conflitos passionais, uma sessão do Parlamento ou uma reunião diplomática – tudo é teatro.Uma das principais funções da nossa arte é tornar conscientes esses espectáculos da vida diária onde os actores são os próprios espectadores, o palco é a plateia e a plateia, palco. Somos todos artistas: fazendo teatro, aprendemos a ver aquilo que nos salta aos olhos, mas que somos incapazes de ver, tão habituados estamos apenas a olhar. O que nos é familiar torna-se invisível: fazer teatro, ao contrário, ilumina o palco da nossa vida quotidiana.Em Setembro do ano passado fomos surpreendidos por uma revelação teatral: nós, que pensávamos viver num mundo seguro apesar das guerras, genocídios, hecatombes e torturas que aconteciam, sim, mas longe de nós em países distantes e selvagens, nós vivíamos seguros com o nosso dinheiro guardado num banco respeitável ou nas mãos de um honesto corretor da Bolsa - nós fomos informados de que esse dinheiro não existia, era virtual, feia ficção de alguns economistas que não eram ficção, nem eram seguros, nem respeitáveis. Tudo não passava de mau teatro com triste enredo, onde poucos ganhavam muito e muitos perdiam tudo. Políticos dos países ricos fecharam-se em reuniões secretas e de lá saíram com soluções mágicas. Nós, vítimas das suas decisões, continuamos espectadores sentados na última fila das galerias.Há vinte anos atrás, eu encenei "Fedra" de Racine, no Rio de Janeiro. O cenário era pobre; no chão, peles de vaca; em volta, bambus. Antes de começar o espectáculo, eu dizia aos meus atores: - “Agora acabou a ficção que fazemos no dia-a-dia. Quando cruzarem esses bambus, lá no palco, nenhum de vocês tem o direito de mentir. Teatro é a Verdade Escondida”.Vendo o mundo para além das aparências, vemos opressores e oprimidos em todas as sociedades, etnias, géneros, classes e castas, vemos o mundo injusto e cruel. Temos a obrigação de inventar outro mundo porque sabemos que outro mundo é possível. Mas cabe a nós construí-lo com nossas mãos entrando em cena, no palco e na vida.Assistam ao espetáculo que vai começar; depois, em vossas casas com os seus amigos, façam suas peças vocês mesmos e vejam o que jamais puderam ver: aquilo que salta aos olhos. Teatro não pode ser apenas um evento - é forma de vida!Actores somos todos nós, e o cidadão não é aquele que vive em sociedade: é aquele que a transforma!

quarta-feira, abril 01, 2009

Perfeito Desconhecido.

Às voltas pela cidade, por suas que não tem idade,
eis que ambos se cruzam sem maldade.
Os olhos presos nos olhos, o sorriso que não sai
por não haver tempo de reacção.
No segundo seguinte são rostos esquecidos, feições perdidas,
imagens sem memória. Os caminhos percorrendo
os passos e os outros vultos, os outros rostos e as
frases a meio suspensas ao passar de um momento
para outro lugar.
Eis que ambos se cruzam de novo, desta vez
sem intenção certa ele pára.
Ela, presa no seu caminho, sorri.
- Posso-te fazer companhia? - diz ele.
Ela ri, o sorriso nervoso do inesperado, ele olha-a de novo
sem feição, e ela avança quebrando-lhe aos poucos
o coração.