Cá continuo à espera. No jardim onde se ouve água a correr de uma fonte e o trânsito infernal dos aviões para a portela. Sempre gostei destes contrastes embora aprecie muito mais os dons musicais da natureza. Não estou sozinha, uns bancos mais à frente uma mulher permanece apática. Sempre tive problemas com pessoas apáticas. Preocupa-me o que se passa lá dentro e é indecifrável cá fora. A apatia é como um presente vazio, alguém que não transmite nada cá para fora. Uma pessoa com inspiração invisível, que não se traduz em letras, nem em música, nem em nada. Tem os lábios vermelhos e fuma um cigarro com um vagar quase invejável. Não tivesse eu esta ideia de que sou diferente de todos os extraterrestres do mundo, que gostava de ser assim e fumar um cigarro com aquela delicadeza e indiferença ao mundo. Quem me dera não me preocupar com o tempo.
Essa é uma questão que consigo contornar com alguma astúcia. É por isso que escrevo, para condensar o tempo para todo o sempre. Cada linha é um momento meu em que o tempo não contou, mesmo sem inspiração nenhuma. Quando eu for velha, vou ler as minhas ideias alteradas da juventude e voltar a sentir o mesmo. Juventude condensada e mais um comprimido para as dores nas costas, lidas com mais cinco dioptrias em cada vista.
Agora que vou chegar atrasada ao compromisso a que me propus no inicio desta divagação, confesso porque escrevo: um dia quero ser interessante e culta como o António Lobo Antunes.