quarta-feira, janeiro 17, 2007

Starálfur

A melodia eleva-se para outros lugares onde a alma se estende, por campos verdes e montanhas frias em que o meu pensamento permanece enrolado nas descrições de acordes, violinos que choram e sintetizam em mim uma pureza de sentimentos, imagino como seriam os sentimentos que brotaram dos outros ainda virgens destas composições.
Levamos a vida às costas num vácuo avassalador, mantemo-la intacta de perturbadores da razão, vivemos tão dispersos das coisas que nos esquecemos de catalogar aquilo que nos significa algo, trancamos nas masmorras de nós mesmos os gritos abafados que nos doem de pensar.
A melodia mostra-me um céu limpo, metáfora do meu espírito inquieto, leve por ter hoje aberto uma porta de onde vejo o verdadeiro brilhar azul do céu, azul, amarelo, roxo, negro, branco, o céu.
O binómio da porta aberta, porta fechada, quantas portas não bailamos nós pela festa da nossa existência, tantas que deixamos de contar os erros, qual é o verdadeiro significado de fechar uma porta? Qual seria o significado deste artigo comum sem o verbo?

A dualidade de abrir a porta de nós mesmos ao mundo, a dualidade de fecharmos e não sermos ninguém. Paradoxo. Porque nunca somos somente um, porque não existimos sozinhos, porque somos cara e coroa da vida.
A melodia abriu as portas do que somos, talvez pela primeira vez tenhamos ouvido o murmúrio ansioso e anónimo que permaneceu tempo demais debaixo do pó.
Temos duas faces, a que vemos no espelho e a que só conhecemos quando a porta se abre, quando o coração se sente apertado pelo ritmo das coisas que nos entram pelo ouvido; passamos demasiado tempo sem conhecer o paradeiro da chave, e do nada ela abriu-nos a porta.
Não vimos as estrelas que caíram diante de nós, não abrimos a porta para as receber, e elas foram cuspidas pelo céu negro que nos aflige lá fora, estávamos preocupados em acertar os passos com os dias amarelentos e tudo passou assim, devagarinho.
Tenho uma porta aberta para acompanhar a descida vagarosa e agora melódica da estrela que borra o meu céu de brilhos ouro e prata. Não existem receios hoje, abri o livro on
de desenharam mãos unidas, lábios colados, sorrisos rasgados que trago na memórias mesmo sabendo que para falar destas coisas não é preciso esperar, acontece tudo do nada.
Hoje dei um significado diferente às lágrimas que me borraram a partitura coçada pelos sofrimentos, limpei a alma amarfanhada porque hoje compreendi o porquê das coisas.
Todos temos um significado, existe qualquer coisa depois de tudo para justificar todas as existências, nenhum nó se desata sem uma mão ou um pedaço de vento.
A estrela que viste cair ontem ao som da música sem idioma, porque ninguém fala a língua da psique, não caiu por acaso. Caiu para tu a contemplares numa iniquidade doce, a lágrima era apenas a alegria da descoberta. Tal como a minha. Hoje e sempre.



(cuspido ao ritmo de Stáralfur de Sigur Rós)

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